Saber Sabendo - Ensinando e Aprendendo | 24 de abril de 2023 | Fonte: Sergio Ricardo

Por que está tão difícil encontrar seguro para grandes riscos?

Todos os dias recebo pedidos de ajuda de corretores de seguros, por não encontrarem no mercado alternativas para colocação de transferência de riscos de seus clientes, seja porque atuam em atividades mais complexas ou por terem sofrido sinistros.

Ocorre que no passado, em tempos de mercado “soft”, era comum, mesmo para riscos de qualidade inferior, que os corretores de seguros conseguissem várias cotações e que, com a decisão do cliente por uma delas, ocorresse uma inspeção tradicional dos empreendimentos, que se revertia em meia dúzia de recomendações genéricas para serem atendidas ao longo da vigência (o que quase sempre era negligenciado pelos clientes), mas não é mais assim.

O fato é que os guidelines de subscrição das seguradoras foram bastante endurecidos em relação a diversas atividades, replicando as exigências dos contratos de resseguros, que simplesmente excluem algumas atividades ou que determinam que elas sejam aceitas após  processo criterioso de análise, o que envolve comprovar que são “riscos altamente protegidos” e sem sinistros nos últimos anos.

Portanto, o mundo mudou radicalmente e os clientes têm que se conscientizar que o mercado não vai mais passar a mão sobre as suas cabeças, fazendo vista grossa para situações de risco potenciais, não geridas e tratadas.

A Circular SUSEP 407/2021 definiu como grandes riscos aqueles que tenham:

  • limite máximo de garantia (LMG) superior a R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais);
  • ativo total superior a R$ 27.000.000,00 (vinte e sete milhões de reais), no exercício imediatamente anterior; ou
  • faturamento bruto anual superior a R$ 57.000.000,00 (cinquenta e sete milhões de reais), no exercício imediatamente anterior.

A referida circular traz ainda que os contratos de seguro de danos para cobertura de grandes riscos serão regidos por condições contratuais livremente pactuadas entre segurados e tomadores, ou seus representantes legais, e a sociedade seguradora, devendo observar, no mínimo, os seguintes princípios e valores básicos: I – liberdade negocial ampla; II – boa fé; III -transparência e objetividade nas informações; IV -tratamento paritário entre as partes contratantes; V – estímulo às soluções alternativas de controvérsias; e VI – intervenção estatal subsidiária e excepcional na formatação dos produtos.

O princípio da liberdade contratual de que trata o inciso I prevalece sobre as demais exigências regulamentares específicas que tratam de planos de seguros, desde que não contrariem as disposições desta Resolução, refletindo a plena capacidade de negociação das condições contratuais pelas partes.

O acima quer dizer que a subscrição de seguros de grandes riscos passou a ser pactuada entre as partes e que cada seguradora poderá estabelecer as suas regras de aceitação, mas não se pode esquecer que por trás delas estão as resseguradoras, que tiveram perdas significativas ao longo dos últimos anos e, por isso, em tempos de mercado mais restritivo, devem agir com as seguradoras, em nome da saúde do negócio.

O objeto do seguro é o risco, que por sua vez, é o efeito das incertezas sobre os objetivos. Isso quer dizer que é necessário reduzir as incertezas para que os objetivos sejam atingidos.

Seguro é um dos tratamentos para fazer frente aos riscos expostos, mas não é o único e cada vez mais as seguradoras não querem ser a única opção dos segurados. Exige-se, portanto, que os segurados demonstrem que de fato gerenciam os seus riscos e que o seguro é o complemento financeiro para fazer frentes às perdas que fogem do controle.

No passado, muitos segurados entendiam que contratar seguros era suficiente para tratar os riscos, sem investir de fato na gestão das suas exposições no nível operacional, ou seja, por meio investimentos contínuos em novos projetos, melhoria de processos, controles e capacitação de pessoas que pudessem melhorar a disponibilidade e a segurança das operações no dia a dia, incluindo medidas efetivas para reduzir a probabilidade e a magnitude das consequências diretas e indiretas dos eventos de riscos.

Quando, ao receberem negativas de cobertura securitária, clientes e  corretores de seguros me perguntam o que fazer, vem a parte difícil, porque eles devem ser convencidos que terão que, muitas vezes pela primeira vez, pensar em gerenciamento de riscos de forma estruturada, iniciando um trabalho no mínimo leva de 6 meses a 1 ano para apresentar os primeiros resultados, envolve investimento em um contrato de consultoria contínua, uma série de capacitações da equipe interna, levantamentos para identificação, análise e avaliação dos riscos, avaliação de controles existentes, planos de ação de respostas etc., além de dedicação de tempo das equipes internas e o cumprimento de uma série de recomendações.

Muitas vezes também significa reestruturar a organização para que de fato se construa uma governança de gestão de riscos e controles.

Talvez a pior parte seja entender que mesmo com todo o acima não há nenhuma certeza de que os subscritores do mercado venham a aceitar as demandas por colocação dos riscos, mas é papel dos corretores, de posse de uma nova fotografia em relação as exposições, fazer o seu trabalho de aproximação dos mercados.

Outro aspecto a considerar é que os sinistros precisam ser tratados como projetos, utilizando metodologias para que se possa atender a todos os requisitos das seguradoras quanto a necessidade de informações, o que geralmente as equipes internas não estão capacitadas para tal. Independente dos prejuízos incorridos, as seguradoras querem entender as fontes e causas dos sinistros, de forma que se possa estabelecer se o que aconteceu foi um descontrole acidental, que por qualquer motivo fugiu aos procedimentos de segurança implantados ou se eles eram de fato insuficientes, mal planejados ou executados e se a experiência serviu para que os necessários ajustes foram realizados. Em que pese os prejuízos, sinistros são oportunidades de revisão e amadurecimento dos programas de gestão de riscos e controles.

Talvez, o mais importante seja perceber que há luz no fim do túnel e a eventual ausência momentânea de cobertura securitária para alguns empreendimentos pode significar uma virada de chave importante, que trará inúmeros benefícios mais a frente, tornando as organizações mais resilientes.

Sergio Ricardo

Executivo dos Mercados de Seguros e Saúde Suplementar com mais de 25 anos de experiência. Mestre em Sistemas de Gestão – UFF/MSG, MBA em Gestão da Qualidade Total – GQT – UFF. Engenheiro Mecânico – UGF. Foi superintendente técnico e comercial na SulAmérica Seguros. Foi membro da ANSP – Academia Nacional de Seguros e Previdência e foi Diretor de Seguros do CVG – RJ. Fundador do Grupo Seguros – Linkedin (https://www.linkedin.com/groups/1722367/). Associado da ABGP, PRMIA, IARCP. Colunista da Revista Venda Mais e do Portal CQCS. Coordenador de Pós-Graduação e Professor dos Programas de Pós-Graduação na UCP IPETEC, UFF, UFRJ, ENS, FGV, IBMEC, UVA, CEPERJ, ECEMAR, ESTÁCIO, TREVISAN, PUC RIO, IBP, CBV e é embaixador na Tutum – Escola de Seguros. Atualmente é coordenador acadêmico de vários cursos de pós-graduação, como o MBA Saúde Suplementar http://www.ipetec.com.br/mba-em-saude-suplementar-ead/, do MBA Seguros https://www.ipetec.com.br/mba-em-seguros-ead-new/ do MBA Governança, Riscos Controles e Compliance e do MBA Gestão de Hospitais e Clínicas na UCP IPETEC. Sócio-Diretor da Gravitas AP – Consultoria e Treinamento, especializada em consultoria e treinamentos em gerenciamento de riscos, controles, compliance, seguros, saúde suplementar e resseguro. www.gravitas-ap.com. Fale com Sergio Ricardo [email protected].

FAÇA UM COMENTÁRIO

Esta é uma área exclusiva para membros da comunidade

Faça login para interagir ou crie agora sua conta e faça parte.

FAÇA PARTE AGORA FAZER LOGIN