Notícias | 23 de setembro de 2004 | Fonte: CQCS

ROTEIRO PARAGUAI – A rota da fraude no seguro de automóvel

1. Em singela síntese passamos a explicar o procedimento de regulação de sinistro e comercialização do veículo no Paraguai:

a) O segurado em determinada data e hora registra um Boletim de Ocorrência noticiando a prática de roubo ou furto de seu veículo.

b) Sempre consta do referido Boletim de Ocorrência que os documentos originais do auto se encontravam no porta-luvas do mesmo, quando do evento. Ocorrendo, ainda, a possibilidade do segurado prestar essa importantíssima informação ao RETIFICAR o Boletim de Ocorrência.

c) Em ato posterior, o segurado noticia o ocorrido à Seguradora com o objetivo de reaver seu ressarcimento ‘devido’, que dará início à regulação de sinistro conforme preceitua o Decreto-Lei nº 073/66, apresentando na Seguradora o B.O e o Aviso de Sinistro.

d) Assim sendo, orientado é o segurado a apresentar determinados documentos ao funcionário regulador do sinistro para a devida comprovação do alegado, como o Boletim de Ocorrência, chaves do veículo e etc. Solicita-se ao segurado um esclarecimento de próprio punho informando se viajou para fora do Estado, se emprestou o veículo a outrem naqueles dias, dentre outros. Ao final desse processo, há o ressarcimento ao segurado ou não, conforme os indícios apurados.

e) Paralelamente a esse procedimento interno administrativo na seguradora, ocorre um outro INDEPENDENTE na Ponte da Amizade Brasil – Paraguai.

f) Ali ficam pessoas que trabalham para agências especializadas em fraude de autos, anotando-se as características dos automóveis, data e horário, bem como cor, marca, etc. que atravessam aquela ponte entrando no Paraguai, cujas placas são brasileiras.

h) Diante daqueles dados característicos dos veículos, como: marca, ano, cor e placas, esses profissionais pesquisam junto ao sistema BIN ou Renavam para verificarem a ocorrência de furto ou roubo daqueles.

i) Havendo a notícia do sinistro, GERALMENTE É INFORMADO ÀS AUTORIDADES COMPETENTES, aqui no Brasil, APÓS 01 DIA, NO MÍNIMO, da comercialização do veículo do segurado, através de contrato de Compra e Venda que possui todos os dados daquele veículo.

j) Evidentemente, o contrato de compra e venda do veículo no Escribano Paraguaio é feito com o documento do veículo. Se o automóvel vai ser roubado ou furtado no dia seguinte, como aquele contrato pode ser confeccionado com todos os dados daquele veículo.

k) Assim, busca-se junto às 12 (doze) únicas Escribanias, “cartórios”, se foi feito algum registro de comercialização de tais veículos, procurando-se pelo número do chassi e do motor.

l) Verificando-se que foi realizada a comercialização do auto, aqueles profissionais levantam a cópia do respectivo contrato de compra e venda que ficou registrado em livro específico, vistado pelo Colégio dos Escribanos, contendo hora e dia.

m) Conforme legislação paraguaia, o funcionamento das Escribanias pode se dar até em dias feriados, bem como aos domingos e a qualquer hora; uma vez que HÁ A OBRIGATORIEDADE DE O RESPONSÁVEL PELO “CARTÓRIO” FIXAR SUA RESIDÊNCIA E SEU DOMICÍLIO NO MESMO ENDEREÇO DO DA ESCRIBANIA PARA MELHOR ATENDER A POPULAÇÃO CONFORME SUA NECESSIDADE E CONVENIÊNCIA.

n) A Lei nº 871/81 do Código de Organização Judicial – Seção III – Art. 111, modificada pelo Art. 1º da Lei nº 963/82, que determina:

“DOS DEVERES E ATRIBUIÇÕES DO TABELIÃO E ESCRIVÃO PÚBLICO, ART. 111 – São deveres e atribuições do Tabelião Público (…)

n) prestar os serviços que lhe são próprios, todos os dias, sem exceção dos feriados, quando forem requeridos. Somente poderá recusar-se em fazê-lo, quando a declaração de vontade do comparecente ou o fato tratado em seu objetivo ou fim, forem contrários à lei, à moral ou aos bons costumes”.

o) Importante frisar que a pesquisa realizada nas Escribanias dá–se pelas características dos veículos constantes de documento específico do mesmo. Em outras palavras, SOMENTE É REALIZADO O CONTRATO DE COMPRA E VENDA DO VEÍCULO, COM A APRESENTAÇÃO DO CRLV.

p) E como as características dos veículos foram anotadas por aquela equipe, a consulta é fácil.

q) Os escritórios de recuperação de veículos, após localizarem o Cartório, procuram os vendedores, posto que como o contrato é feito em duas vias, uma para o vendedor e outra o comprador, , porém registrado no livro do cartorário, a que fica com o primeiro não tem mais serventia para ele. Assim, aqueles escritórios o procuram e obtém a cópia do vendedor entregando-a para a empresa reguladora de sinistro que, por sua vez, envia à seguradora cópia da comercialização do veículo.

r) Importante lembrar que, de posse do contrato de compra e venda do automóvel, tem o seu proprietário paraguaio, o prazo máximo de 90 (noventa) dias para registrá-lo no Automotores competente.

s) Desta maneira, o comprador pode circular com o automóvel apenas de posse do respectivo contrato de compra e venda (o que equivale ao nosso DUT).

t) Passo seguinte, objetivando o Registro no Automotores, o comprador PAGA UMA TAXA NA PREFEITURA REFERENTE AO REGISTRO PROVISÓRIO DO VEÍCULO recebendo o veículo placas provisórias o que lhe garante circular por um período de 90 (noventa) dias. È a chamada Certidão da Municipalidade.

u) Ainda tem-se a possibilidade de ser o veículo fiscalizado por agente especializado em chassis da Polícia Federal que verifica, de posse do documento do veículo, ou seja, o CRLV, o motor, chassis, o condutor, bem com se não há qualquer adulteração nos números identificativos do veículo e reclamação de roubo ou furto. Deixando registrado em livro próprio, como de praxe.

v) Não havendo qualquer irregularidade na fiscalização do automóvel é liberado para seguir com seu destino.

x) Frisa-se que sendo por AMOSTRAGEM A FISCALIZAÇÃO FEITA PELA POLÍCIA FRONTEIRIÇA, em virtude DA FALTA DE MAIOR DISPONIBILIDADE DE PESSOAL, e ainda em face da grande quantidade de autos que passam pelo local numa média de 3.000/dia, sendo que nas quartas – feiras e sábados podem chegar a 5.000/dia, nem sempre são remetidos às empresas recuperadoras de veículos a informação de registro em livro específico.

x.1) Significa que o fato de às vezes constar:- Ao manusear o Livro de Veículos Fiscalizados existentes na Ponte Internacional da Amizade, ali NÃO for encontrado o registro de saída do veículo do País, NÃO PODE SER INTERPRETADA COMO SE O VEÍCULO EM HIPÓTESE ALGUMA TIVESSE PASSADO PELA FRONTEIRA.

y) Comumente acontece de a Seguradora tomar conhecimento dessa comercialização tempos após o regular pagamento da indenização.

z) Observou-se, já por diversas vezes, que durante o procedimento administrativo de regulação de sinistro realizado na seguradora, quando o segurado toma conhecimento da comercialização do seu veículo, bem como das contradições existentes entre a data do negócio e a do Boletim de ocorrência e de sua declaração prestada, o mesmo desiste do pleito de pagamento da indenização a que teria, em tese, direito.

2. Ademais, no que se refere à elaboração do Contrato de Compra e Venda, corrobora do todo mencionado nos itens i), k), l), m), n), e o), a Declaração do Escrivão Público Titular do Registro Notarial nº 1102 Enrique Walter Mayeregger Bodadilla, ora juntada – doc. nº I – em caso semelhante –

2.1 Declaração esta que CERTIFICA e GARANTE a transação de venda do veículo na data e horário informados e a autenticidade das assinaturas ali acostadas estando devidamente registradas em livro correspondente – doc. nº. II em caso semelhante –

3 Da comprovação do vínculo existente entre o Segurado e/ou proprietário do veículo para com a com a fraude, e com o seu condutor quando da fiscalização/passagem pela fronteira.

3.1 Em se cuidando desse vínculo, o proprietário do veículo fornece ao condutor: uma AUTORIZAÇÃO, com firma reconhecida outorgando-lhe poderes para transpor as fronteiras nacionais e a trafegar com o veículo de sua propriedade durante determinado período -; e também o documento ORIGINAL do veículo, uma vez que sem estes, durante a fiscalização o veículo será apreendido, podendo o Auto de Entrega ser lavrado, mas somente em nome do proprietário, ou de seu representante mediante Mandato Procuratório.

3.2 Em caso de Locação de Veículos, essa AUTORIZAÇÃO será em forma de ADITIVO AO CONTRATO, devendo ainda estar devidamente acompanhada do CRLV do veículo, e com firma reconhecida – conforme documentos de números III e IV –

3.3 E, ainda, mediante a apresentação do Documento Original do veículo – DUT, pelo condutor/atravessador que o Segurado/proprietário do veículo informaram no Boletim de Ocorrência ter sido levado com o automotor na data do roubo ou furto.

4. Hoje em dia, se aperfeiçoou mais o combate à fraude. O veículo passa pala Ponte da Amizade – Foz de Iguaçu e Cuidade Del Este. De fato, os olheiros das firmas terceirizadas, imediatamente à passagem do veículo, enviam um e-mail para todo o mercado segurador informando essa passagem. Puxam através do Renavam, se há restrições com aquele veículo.

5. É cediço que pela placa brasileira e do lado brasileiro, consegue-se o renavam que naquele momento não consta registro de furto ou roubo.

6. Logo após a feitura do contrato de compra e venda. O atravessador avisa o segurado/fraudador que ele já pode se dirigir à delegacia e confeccionar o B.O que, invariavelmente é posterior ao e-mail e posterior ao contrato de compra e venda.

7. Como disse anteriormente, as empresas de sindicância enviam o contrato de compra e venda para as Seguradoras e, essas por sua vez, aguardam o segurado ingressar com o aviso de sinistro e o BO. Aí é só analisar as datas: e-mail que é expedido antes do contrato de compra e venda, que por sua vez é confeccionado antes do B.O.

8. Passamos, após juntarmos as provas nos inquéritos referindo ao análise das datas já mencionadas, a maioria dos membros do Ministério Público, começou a duvidar daquele contrato.

9. Foram arquivados muitos inquéritos policiais e aconteceram muitas absolvições. Estive diversas vezes no Paraguai para saber, após a confecção do contrato, qual era o trâmite regular.

10. Descobrimos que aquele contrato de compra e venda, que possui código de barra e é expedido pela Suprema Corte Paraguaia, era levado a registro na Prefeitura – Certidão da Municipalidade – corresponde ao nosso IPVA e ao comprador, aquele mesmo que figura no contrato, que tem até 90 dias para registrá-lo no Registro de Auto Motores, caso contrário o veículo é apreendido. Tanto a Certidão da Municipalidade, como o Registro de Automotores, é requerido via judicial.

11. Faz-se uma petição, chamada “ Hábeas Data” o judiciário Paraguaio determina aos órgãos competentes, que se junte naquele processo, a certidão positiva do veículo, isto é, se há registro do veículo na Municipalidade e no Automotores. Havendo referido registro, está confirmada a fraude.

12. Muitas vezes, se consulariza aqueles documentos, no Consulado Brasileiro, na Paraguai. Aí eu pergunto a alguns membros do Ministério Publico e alguns membros da Magistratura: Todos são falsários: A Suprema Corte Paraguaia, que exerce fiscalização nos contratos de compra e venda? O Judiciário Paraguaio que fornece as certidões através do “ Habeas Data “, a Seguradora, etc,etc. Só o fraudador que é o “ coitadinho”?

13. “A priori”, parece que o prejuízo da fraude é suportado pela seguradora, mas não é. Aumenta-se a sinistralidade, o seguro fica mais caro, aumenta-se o prêmio ( valor que o segurado paga para a seguradora), já que indenização é a seguradora que paga ao segurado – alguns membros do MP e da Magistratuta não sabem a diferença – e ao invés de massificar-se o seguro como nos Estados Unidos, nós estamos eletizando o seguro. Já está acontecendo, porque apenas trinta por cento da frota nacional é segurada devido o preço do seguro, além é claro, de estarmos incentivando a criminalidade.i

14. Nossas autoridades tem que ter em mente que o maior patrimônio da seguradora é a credibilidade. Alguém irá fazer seguro com uma empresa que não paga? Claro que não.

15. Pelos dados fornecidos pela FENASEG – Federação Nacional das Seguradoras – durante o primeiro sementre deste ano, foram pagos milhões e milhões de indenizações por sinistro de automóveis, desse valor, trinta por cento é fraude e desse porcentual, não apuramos um por cento. Quem paga a conta?

16. Aqueles segurados que cumprem corretamente suas parcelas, porque como foi dito acima, a Seguradora aumenta o valor do prêmio. Então chega-se a seguinte realidade: Todos nós pagamos seguro, até nossas autoridades e, deixando de combater energicamente a fraude, iremos nos cotizar para cobrir o rombo deixado pelo “ engraçadinho fraudador”. É justo? Será que nossas autoridades concordam em pagar mais caro pelo mesmo seguro, devido o fraudador coitadinho que tem o inquérito arquivado por mera suspeita de documentos inidônios,ou é absolvido?

17. Já imaginaram o conflito Internacional que pode ser criado, se o Poder Judiciário Paraguaio souber que eles( MP e Magistratura ) afirmam que o contrato é falso, que tudo que vem do Paraguai é falso? Se eles não sabem, precisam saber que quando se apresenta um documento, enquanto não se provar sua falsidade, ele é verdadeiro. O ônus da prova compete a quem alega. Nós já notamos que, ao nos habilitarmos como assistentes de acusação, automaticamente a maioria de Juízes e Promotores nos hostilizam e fazem a defesa indireta do fraudador. Quero deixar claro que o fraudador nunca será segurado, pois ele contrata o seguro, paga uma ou no máximo duas parcelas e depois aplica o golpe na Seguradora. Existem verdadeiras quadrilhas especializadas em aplicar golpes na Seguradora.

18. As Seguradoras, por sua vez, sentem receio de procurar a Justiça, para levar à apuração dos fatos, porque ou os inquéritos, em sua maioria são arquivados ou se houver ação penal, também impera a maioria de sentença desfavorável. A Seguradora, então, nestes casos, além de pagar a indenização ( valor do automóvel) é processada por danos morais. Isto quer dizer que, o fraudador recebe duas “ indenizações “, as quais não tinha direito a nenhuma.

19. Finalizando, estamos na contra mão de direção, porque enquanto nos Estados Unidos se massifica o seguro com prêmios baixos( valor que o segurado paga para a seguradora), no Brasil estamos alijando as classes menos favorecidas a terem acesso ao seguro que, nada mais é do que repor o patrimônio realmente sinistrado e não fraudado. Quem perde? Seguradoras que vão disputar seus produtos numa faixa restrita da população brasileira, perde o corretor de seguros porque vende menos, perde os terceirizados que atuam na área e principalmente perde o segurado honesto, porque é ele que vai pagar a conta. Anotamos por último que, a cada semestre a fraude aumenta mais. Será que o Mercado Segurador agüenta? Só o tempo dirá.

Carlos Alberto Manfredini
– Advogado –
– OAB/SP 44.266

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