Moradores do Rio Grande do Sul com casas, carros, negócios e plantações afetados pelas enchentes podem ter os prejuízos cobertos pelo seguro, caso tenham contratado uma apólice e dependendo do que diz o contrato.
As regras são diferentes conforme o tipo, se residencial, automotivo, de vida, patrimonial, entre outros. No caso do seguro obrigatório no financiamento habitacional, o cidadão tem o direito à cobertura e deve acionar o banco que concedeu o crédito da casa própria.
Estimativas são de que 1,4 milhão de pessoas foram afetadas pela catástrofe climática nos 336 municípios onde foi decretado o estado de calamidade pública.
Ao contabilizar os prejuízos, quem contratou seguro deve saber que cada tipo de contrato de seguro tem sua especificidade e é necessário entender a cobertura de cada contrato firmado.
Segundo dados de 2021 da Fenseg (Federação Nacional de Seguros Gerais), 17% das casas brasileiras têm seguros. Enquanto 30% dos automóveis emplacados no país têm algum tipo de cobertura, de acordo a Susep (Superintendência de Seguros Privados).
A advogada Carolina Vesentini, do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), explica que não são todos os seguros que cobrem catástrofes como as chuvas do Rio Grande do Sul. Segundo ela, A cobertura varia conforme a apólice e a companhia de seguros.
Carolina pontua que, muitas vezes, é necessário adquirir coberturas adicionais para eventos como esse.
“As empresas só têm a obrigação de cobrir o que estiver no contrato, por isso é tão importante prestar atenção na hora de assinar. Se considerar que vale a pena pagar à parte pela segurança da cobertura de alagamentos, ainda assim, precisa estar atento ao valor total do seguro”, argumenta a advogada.
COMO É O SEGURO OBRIGATÓRIO PARA QUEM FINANCIOU A CASA PRÓPRIA?
O seguro habitacional contratado junto às operações de financiamento imobiliário garante indenização em casos de danos físicos ao imóvel, como inundação e alagamento, com quitação do financiamento nessas situações, além da reconstrução ou reparos
Chamado de DFI (Danos Físicos ao Imóvel), é um seguro que se aplica em situações como caso de incêndio, queda de raio ou explosão, vendaval, desmoronamento total ou parcial, destelhamento e inundação ou alagamento.
A cobertura começa na data de assinatura do contrato de financiamento e termina quando o contrato é quitado. Segundo o advogado Marcelo Tapai, é comum também que, em contratos de locação, o locador exija a contratação de uma apólice que cubra os danos.
“Para os imóveis cuja as apólices são em decorrência de financiamento imobiliário, o valor da indenização vai até o limite do valor do imóvel, obtido por meio da correção do preço de aquisição”, diz o especialisa em direito imobiliário.
“Nessa conta, a seguradora também poderá aplicar uma redução do valor, segundo critérios matemáticos e financeiros, considerando, dentre outros, o tempo de utilização e as condições de uso, funcionamento e operação”, afirma.
COMO É O AVISO DE SINISTRO DO SEGURO HABITACIONAL?
O aviso de sinistro deve ser formalizado com a seguradora o mais breve possível, por escrito. O proprietário deve usar anúncios oficiais do município, reportagens de jornais e fotos da área alagada para comprovar o dano ao seu imóvel. A seguradora pode providenciar uma perícia se entender que os danos são menores do que os alegados, mas essa prova cabe à seguradora, afirma Tapai.
A Caixa, principal operadora do crédito habitacional no país, diz que, entre as medidas adotadas pelo banco às famílias afetadas pelas fortes chuvas no Rio Grande do Sul, está o reforço das equipes das centrais de atendimento do seguro residencial e habitacional, além do fluxo facilitado para acionar o sinistro, com documentação simplificada, para acelerar o atendimento.
Para acionamento de sinistros e assistências, o mutuário deve ligar nas centrais de atendimento do banco:
- 0800-2741000 (para contratações até 15/02/21 – seguros e assistências)
- 0800-7224926 (para contratações após 15/02/21 – assistências)
- 0800-7224923 (para contratações após 15/02/21 – sinistros)
A Caixa anunciou que os clientes com contratos de financiamento habitacional podem solicitar uma pausa de até três meses no pagamento.
A BB Seguros informa que priorizou o atendimento aos segurados do RS nos canais de atendimento da empresa para melhor acolhê-los e tem realizado contato ativo com clientes para avisar sobre a disponibilidade de cobertura dos seguros residencial, auto, empresarial e rural.
“A seguradora também reforçou e priorizou a esteira de assistências e sinistros, além de simplificar o processo de abertura e análise”, diz nota.
Foram ampliados ainda os valores dos serviços de limpeza, cobertura de telhados e desentupimento previstos nas apólices dos seguros residencial e empresarial. Reguladores e peritos foram enviados para as regiões atingidas, com possibilidade de realizar a vistoria presencialmente ou de forma remota.
O QUE O SEGURO HABITACIONAL OBRIGATÓRIO COBRE?
O seguro para danos físicos ao Imóvel no financiamento habitacional é uma exigência legal presente no SFH (Sistema Financeiro da Habitação) e significa que se o mutuário não quiser contratar a apólice, o comprador não tem o crédito liberado.
A cobertura básica, a mais comum, não cobre danos aos bens móveis, como armários, eletroeletrônicos e objetos de uso pessoal. Em caso de necessidade de desocupação do imóvel, o seguro cobre as prestações do financiamento.
O FINANCIAMENTO HABITACIONAL EXIGE ALGUM OUTRO SEGURO?
Há ainda um outro seguro exigido pelas instituições financeiras para conceder um financiamento imobiliário pode ser acionado pelos herdeiros de vítimas fatais das chuvas no Sul.
O seguro MIP (Morte ou Invalidez Permanente) tem como objetivo proteger tanto o comprador quanto a instituição financeira que concedeu o financiamento. A apólice quita o saldo devedor do financiamento em caso de morte ou invalidez permanente do segurado.
COMO FUNCIONA O SEGURO RESIDENCIAL NÃO OBRIGATÓRIO?
A Advogada Janaína De Castro Galvão, sócia da área Cível e de Resolução de Conflitos do Innocenti Advogados, afirma que alguns seguros residenciais podem incluir coberturas para danos causados por catástrofes naturais, como inundações, terremotos, entre outros, dependendo da apólice contratada. Tudo depende do modelo contratado.
Segundo ela, o seguro, seja residencial ou automotivo, deve ser acionado o quanto antes. “Em caso de sinistro por enchentes e inundações, é fundamental seguir os procedimentos estabelecidos pela seguradora e fornecer toda a documentação necessária para a avaliação e indenização do dano. Na apólice deverá constar a forma correta de acionar a seguradora e a lista dos documentos a serem fornecidos.”
A especialista acrescenta que é importante o registro dos danos materiais causados pelas enchentes. Ela aconselha a captura de fotos e vídeos com os estragos na residência, documentos danificados, pertences perdidos, entre outros, pois essas informações serão úteis ao acionar o seguro e buscar programas governamentais de auxílio a vítimas de desastres naturais.
De acordo com o levantamento mais recente feito pela FenSeg, em 2021, menos de 1% das apólices de seguro residencial no Brasil têm contratada a cobertura para alagamentos (atualmente, o país soma 12,7 milhões de lares segurados, 17% do total).
COMO FUNCIONA O SEGURO PARA AUTOMÓVEIS?
O seguro auto é um dos tipos de seguro mais comuns. Além de prever cobertura por danos e acidentes do motorista ou de terceiros, a apólice pode trazer a cobertura contra enchentes. Quando o assunto são os desastres naturais, a maior parte das seguradoras já prevê coberturas deste tipo em seus contratos.
As situações que garantem ao titular do seguro de automóvel o direito de indenização são muitas: queda de árvore, chuva de granizo, inundações, raios e até mesmo incêndios ou explosões, entre outras.
Carolina Vesentini relembra que, desde 2004 a Susep, órgão que fiscaliza as operações do mercado de seguros, determina que os planos básicos para automóveis devem cobrir acidentes causados por catástrofes naturais. Já planos mais completos, como o seguro compreensivo, resguarda o comprador em caso de alagamento parcial ou total ocasionados por água doce, queda de granizo e queda de árvores.
Especialistas afirmam, no entanto, que é preciso ter atenção em relação às regras e às exclusões do contrato antes de fazer a contratação do seguro. É possível que a seguradora defina alguns requisitos para pagamento de indenização em caso de desastres naturais e é preciso conhecer esses critérios para não ser pego de surpresa em uma situação de emergência.
Pessoas que vivem em cidades com casos constantes de inundação, por exemplo, podem pagar mais caro para ter essa cobertura. Em 2022, o seguro auto arrecadou R$ 51 bilhões em prêmios, uma evolução de 32,8% sobre o ano anterior.
O QUE É O SEGURO DE VIDA E COMO ELE FUNCIONA?
De acordo com o Idec, seguros de vida são aqueles que visam proteger segurados ou beneficiários em caso de invalidez ou morte, devido a ocorrências naturais ou acidentais. Muitas companhias que oferecem esse tipo de seguro já possuem alguns contratos com a cobertura de danos causados por desastres naturais.
O instituto afirma ainda que se o titular de um seguro de vida morrer vítima de uma tragédia causada pelas chuvas, por exemplo, o beneficiário terá direito à indenização prevista no contrato. Vale ressaltar, ainda, que assistência funeral para o titular do seguro também costuma estar prevista em contratos assim.
O QUE LEVAR EM CONTA AO CONTRATAR UM SEGURO?
No momento da contratação, é necessário considerar o valor que o contratante tem para dispor no seguro, o bem que será segurado, a cobertura e os limites adequados, além da regionalização, que avalia os eventos com maior probabilidade de ocorrência, e o reconhecimento da seguradora no mercado.
É preciso ainda ter em mente o que as seguradoras levam em consideração ao avaliar os estragos. No caso de automóvel, por exemplo, consideram se o motorista foi pego de surpresa pela enchente ou outro dano, se tentou atravessar as águas com o veículo propositalmente, entre outras situações.
Caso se prove, por meio de inspeção no veículo, que o motorista agiu deliberadamente, o seguro pode suspender o pagamento da apólice.
O QUE FAZER SE A SEGURADORA NÃO PAGAR A INDENIZAÇÃO?
A supervisora de Relacionamento com o Associado do Idec, Eneida Souza, afirma que, caso a seguradora se negue a pagar a indenização, o segurado deve procurar órgãos de mediação como o Idec e o Procon para a negociação entre o contratante e a seguradora. Caso a violação seja coletiva, pode-se acionar o Ministério Público.
O advogado Carlos Ximenes, sócio do escritório Castro Barros Advogados, especializado na área de seguros e resseguros, recorda que no período da Covid-19 não havia cláusulas sobre pandemias, por exemplo, e que naquele momento foi criado um contexto de exceção, o que pode acontecer em outras situações.
“A situação [das enchentes no RS] é muito semelhante ao que a gente teve no início da pandemia. Muitas incertezas do que vai acontecer daqui para frente. O que aconteceu naquele momento foi que muitas seguradoras, por questões reputacionais ou sensibilidade, coisas que se aplicam a esse momento de novo, acabaram mitigando essa cláusula dando a mesma cobertura”, afirma.
“E essa situação pode acontecer de novo. Pode haver uma comoção geral das seguradoras não negarem esse tipo de garantia. É claro que isso vai depender do caixa das seguradoras”, finaliza.