Notícias | 16 de junho de 2008 | Fonte: Revista Apólice

Seguro como forma de caução para juízo

Expectativas e análises sobre o ramo garantia judicial, que vislumbra crescimento impulsionado por Lei que entrou em vigor no início deste ano
Antes do seguro garantia judicial, as únicas formas de “garantir o juízo”, ou seja, garantir o pagamento de indenização em ações transitando em juízo nas áreas do direito trabalhista, tributário e cível, eram através de cauções como penhoras e depósitos judiciais. Quando a lei não determina a espécie de caução, esta pode ser prestada mediante depósito em dinheiro, papéis de crédito, títulos da União ou dos Estados, pedras e metais preciosos, hipoteca, penhor e fiança.
Pelo seguro garantia judicial, também conhecido como seguro fiança judicial, as seguradoras cobrem todas as obrigações que possam ser imputadas à empresa garantida até o valor da importância segurada (incluídos os acréscimos legais devidos, honorários advocatícios, custas judiciais ou outras decorrentes de sucumbência sem qualquer restrição) em caso de inadimplência da empresa garantida após ter sido promulgada a sentença do Juiz determinando o pagamento da importância devida.
O tomador é sempre a pessoa jurídica, parte litigante que questiona judicialmente a validade legal da obrigação pecuniária decorrente de contrato ou lei e o segurado poderá ser a pessoa física ou jurídica de direito público ou privado, posicionada na condição de credor de obrigação pecuniária sub-judice, decorrente de contrato ou lei, questionado em qualquer juízo, instância ou tribunal. O seguro garantia judicial aplica-se às ações movidas em âmbito nacional, em especial as de direito tributário. A cobertura do seguro vigora até a extinção das obrigações do tomador, devendo este efetuar o pagamento do prêmio até a liberação da apólice pelo segurado, independentemente do prazo de vigência nela indicado, e o valor da garantia é o valor declarado na apólice como importância máxima indenizável, podendo ser o valor que está em questão, acrescido de juros, correção monetária, honorários advocatícios e custas judiciais.

Notas Técnicas
Em 1999, o corretor Jônio Gondar, sócio-proprietário da Mutual Garantias e Seguros (a corretora, não a seguradora homônima) que trabalha apenas com seguros financeiros, sendo o ramo garantia o principal, acabou “lançando” o seguro garantia judicial como nova modalidade do setor. O corretor conta que foi por acaso, para suprir a demanda de um cliente que precisava caucionar uma execução judicial. Gondar entrou em contato com a seguradora Martinelli, extinta seguradora do ramo garantia, uma das grandes parceiras da Mutual na época. “Precisávamos de um seguro que não existia”, diz. Foi então que, em parceria com a seguradora, criaram a primeira apólice de seguro garantia judicial, com a devida autorização da Susep, através de nota técnica.
Depois da primeira apólice, outras seguradoras de garantia começaram a criar produtos semelhantes. “Sabemos que no mercado de seguros todo produto que é lançado, em seguida, é copiado”, lembra Gondar. Essas seguradoras atuavam com a autorização, de forma avulsa, da Susep, através de outras notas técnicas que autorizavam cada produto e cada apólice.

Circular
Só depois de quatro anos, em 03 de junho de 2003, a Susep publicou sua Circular Nº 232, que formalizava essa nova modalidade. “Com a circular, virou oficial e as seguradoras aumentaram a produção desse seguro”, diz Gondar.
Com a Circular Susep 232/03, as seguradoras da área de garantia começaram a comercializar o garantia judicial, mas de uma forma tímida, porque a norma era intralegal (regulamentada de forma restrita, no caso, por apenas uma entidade do mercado de seguros). “A Circular dizia o que é o Seguro Garantia Judicial, qual seu prazo de vigência, como deve ser aplicado … Enfim, nada muito específico”, conta Adriano Lanfranchi de Almeida, gerente comercial da J. Malucelli Seguradora. “Embora fosse um produto normatizado, com garantia de grandes seguradoras, com o respaldo do resseguro, às vezes o juiz, ou quem estava do outro lado do processo, não aceitava porque não era uma caução que estava no Código de Processo Civil”, conta Godan. Faltava ainda a correta adequação da Circular Susep, que trouxe este seguro à luz, aos moldes da normatização processual, para que tal modalidade de garantia fosse plenamente aceita e passasse a fazer parte do rol de garantias visando a “garantia do Juízo” em demandas judiciais dessa natureza.

Lei
Apenas em dezembro de 2006, com a reforma do Código de Processo Civil (código maior que rege a luta processual em seu andamento jurídico), foi inserida a previsão do seguro garantia judicial, no artigo 656, e publicada a Lei nº 11.382/06, que autorizou efetiva e plenamente a substituição da penhora de bens ou dinheiro, em um processo de execução perante o Poder Judiciário, por este seguro.
No dia 21 de janeiro de 2007, a Lei entrou em vigor e desde então o mercado de seguro garantia já vem trabalhando num cenário um pouco diferente, vislumbrando que este produto faça parte do cotidiano dos tribunais brasileiros.
“Dentre os aspectos relevantes da nova Lei, destacamos a possibilidade de aceitação imediata do seguro pelos juízes, quando de sua apresentação como forma de garantia, o que até o presente momento dependia da argumentação do advogado, uma vez que tal modalidade apenas era regulamentada por meio de Circular da Susep”, explica Adriano Almeida.

Mas não é obrigatório
A Lei deu um impulso neste mercado. No entanto, é importante deixar claro o seguinte: mesmo com o seguro devidamente regulamentado, pode haver o contraditório, tanto da parte credora como do juiz, e optarem por outra modalidade de caução. “Isso não é uma questão do seguro, e sim de qualquer outra modalidade”, ressalta Almeida. “Se uma empresa oferece um bem em imóvel e a parte credora e o juiz acreditam que não tem liquidez, pode ser contestado. Da mesma forma o título da vida pública, com vencimento a muito longo prazo ou que também não tenha liquidez suficiente, pode ser contestado”, explica Almeida. Integrantes do próprio mercado de seguros ainda estão confusos. “Tem gente dizendo que é obrigatório o juiz aceitar, mas não é. Ele só é obrigado quando há uma ação de execução contra devedor solvente”, revela Horácio Oliveira d’ Almeida e Silva, presidente da Berkley International Brasil. “É o único caso, porque tem a solvência e pode oferecer garantia, e então o juiz é obrigado a aceitar enquanto há o processo. Em outros casos, pode ou não aceitar”, afirma Silva.
“Antes da Lei, enquanto era só regulamentado pela Susep e não tinha precisão legal pelo Código Civil, o juiz poderia aceitar ou não, dependia de argumentação de advogados. Isso frustrava o trabalho de fazer uma apólice específica, fazer a colocação do resseguro e o juiz não aceitar”, recorda Carlos Frederico Ferreira, diretor técnico da Áurea Seguradora. Hoje, mesmo não sendo obrigatório, os especialistas afirmam que é rara a recusa.
No caso, podem ser contestadas liquidez e rapidez do pagamento do seguro, que é o que juiz e a parte credora querem. Em outras palavras, a parte credora quer dinheiro. Por isso, a seguradora tem que oferecer garantia o mais próxima possível do dinheiro em espécie. “Temos que divulgar esse produto, dizer ao juiz e à parte credora que o seguro é liquido, certo e exigível no momento do trânsito do julgado da ação; e ele pode ser executado, cobrado, sempre que necessário, como se dinheiro fosse”, defende Adriano Almeida.
Obrigatório mesmo é difícil que venha a ser. Porque existe uma determinação do Poder Judiciário onde o juiz deve dar preferência para a caução que, dentro do valor exigido, custe menos em taxas para a empresa processada. “Teoricamente, ele não pode se negar a aceitar o mais barato, seja fiança de seguradora ou bancária”, frisa Horácio Silva.

Os vilões
Como deve ser usada a forma de fiança mais barata, a questão do preço muitas vezes define o mercado. A grande concorrente do seguro garantia judicial sempre foi a fiança bancária. Ainda mais hoje, quando os juros vêm caindo e o preço dela baixando. “Até três ou quatro anos, quando os juros estavam mais altos, o preço da seguradora era imbatível perante o banco. Hoje, dependendo do caso, está o mesmo preço e às vezes até mais barato”, diz Jônio Gondar. Muitos juízes preferem a bancária, no caso de terem o mesmo custo, pois é mais conhecida. “Ainda se vê desconhecimento das empresas que usam as outras formas de caução e não o seguro garantia judicial”, diz Carlos Frederico Ferreira. “Claro que, dependendo de quem for o banco e a seguradora, se a seguradora tiver melhor nome e credibilidade, pode levar vantagem”, acredita Gondar.
O preço do seguro garantia judicial é dado sempre pelos resseguradores, nunca pelas seguradoras. “Se os resseguradores entenderem que está havendo uma queda de juros e a fiança bancária está crescendo, precisam baixar preços para continuarem na competição. Com a abertura efetiva do mercado, com a possibilidade de cotar tarifas em outras resseguradoras, talvez consigamos preços mais baratos”, afirma Gondar.
Para José Eduardo Medrado, diretor da UBF Garantias & Seguros, pior que o problema do preço, o que trava o crescimento desse mercado – e fator que ainda impede a UBF de trabalhar nesse nicho – é outro ponto também relacionado ao resseguro. “Como é que o segurador pode, com seriedade, dar uma apólice para o juiz que tem validade infinita se essa garantia não for dada por nós? E se o ressegurador não apoiar na renovação?”, questiona Medrado. Ele explica que, resolvido esse problema, sobre o qual tem conversado bastante com resseguradores, a UBF entrará com força no seguro garantia judicial, pois sabe que as empresas, principalmente as que possuem um considerável volume de contencioso, têm se interessado por essa nova modalidade de garantia e, certamente, lhes será uma boa alternativa de caução.
Horácio Silva dá uma solução para o ponto discutido por Medrado. “O juiz retém a apólice sim, mas se ela for de renovação anual, será trocada ano a ano, e caso não possa ter o apoio do resseguro, a empresa processada oferece outra garantia”, afirma Silva. “Há seguradoras que fazem essa apólice com vigência de mais de um ano (apólice plurianual), até infinita, mas é muito arriscado. A preferência das seguradoras, assim como a Berkley, é por contratos renovados anualmente, até pra elas poderem cancelar em um ano. O contrato tem que ser bilateral, precisamos ter o direito de cancelamento”, explica.

Campo pra crescer
Primeiro foi a Circular, depois a Lei. Cada uma dessas medidas impulsionou o mercado de seguro garantia judicial, divulgando-o mais e trazendo mais credibilidade e aceitação.
Segundo Carlos Ferreira, depois da Lei, todas as seguradoras do ramo percebem maior procura, fazem mais cotações, mas ainda é cedo para medir a evolução. “Os clientes que nos procuram já estão conscientes, cientes da lei e do produto, também temos divulgado e comentado mais do produto”, diz. Para Horácio Silva, não é possível ainda medir o crescimento do ramo depois da Lei, pois ainda não se passou nem um ano, e como o seguro garantia judicial não é do tipo sazonal, como, por exemplo, a garantia de entrega de açúcar, “pode não vender nada no início do ano e no fim vender muito”.
Um ponto que conta bastante a favor do seguro garantia em detrimento da fiança bancária é a questão do crédito bancário da empresa. Este é um seguro que tem característica diferenciada dos outros de garantia, por ser um produto de risco financeiro. Ele concorre com a fiança bancária, que se for usada, entrará no limite de crédito bancário da empresa. Fazendo à parte, com a seguradora, não compromete o limite de crédito no banco e seus negócios.
“Esperamos para os próximos cinco anos um crescimento entre 50 e 70% dessa carteira na Áurea, porque são valores altos e trata-se de um produto que tem continuidade, a cada ano tem reajuste da importância segurada”, anuncia Ferreira. “Mas, dizer que ele vai ser o maior dentro do garantia é difícil, porque o Brasil está investindo muito em projetos de infra-estrutura, como o PAC, e isso impulsionará outros setores do ramo”, pondera.

Papel do corretor
Como outros do ramo, o seguro garantia judicial é destinado a grandes empresas e envolve grandes valores. Quando a seguradora faz a análise e aceitação do risco, observa balanços financeiros e históricos, para comprovar que se trata de uma empresa sólida na atividade que desenvolve e tenha projeções de que se manterá estável por um longo prazo.
Justamente por isso, para a divulgação desse produto, as seguradoras priorizam os corretores que têm em suas carteiras grandes clientes. Geralmente, os corretores que atuam com grandes empresas em outras áreas, se interessam em apresentar o seguro garantia judicial.
“Não é mais nem menos difícil vender esse ramo, por ser um negócio que depende de uma análise prévia da empresa. O corretor faz consulta, nos manda as peças processuais e vemos se encaixa o seguro”, conta Horácio Silva.
Para lidar com advogados e tanto “advoguês”, as seguradoras disponibilizam profissionais para esclarecerem dúvidas dos corretores que não fizeram faculdade de Direito. “Ele não pode titubear quando for oferecer o produto aos advogados”, diz Adriano Almeida. Horacio Silva discorda: “O corretor não precisa entender de Direito, é uma preocupação nossa. É apenas um abre-portas. Ele tem que informar para o segurado que existe o produto e, a partir daí, trazer as consultas reais para as seguradoras analisarem se é viável. Depois, o trabalho é da seguradora”.
“O corretor é indispensável para a divulgação do produto, precisa orientar o cliente quando falar com escritórios de advocacia que na ocasião de ter um processo, estarão seguros. E também levantar com as empresas outras formas de garantia que elas já têm e apresentar o seguro garantia judicial para fazer a substituição”, reforça Ferreira.
Para Silva, o corretor não deve vender para o escritório de advocacia e sim para o departamento financeiro da empresa tomadora ou presidente dela. “Alguém que tenha ciência de que, amanhã ou depois, possa enfrentar uma ação e não possa ou não queira mexer em seus ativo

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