Notícias | 1 de junho de 2007 | Fonte: GAZETA

O seguro de fidelidade

“Sorria a nossa Pátria Mãe tão distraída, sem perceber que era subtraída, em tenebrosas transações”.

Não sei bem por que motivo voltei recentemente a pensar no Seguro de Fidelidade. Nos anos 50 e 60 tal modalidade de seguro prosperou de forma acelerada e depois foi-se reduzindo até o desaparecimento.

Se o leitor pensa que tal seguro cobria fidelidade conjugal e que, conseqüentemente as seguradoras, com sua reconhecida aversão a riscos, fugiram dele, está enganado.

O Seguro de Fidelidade Funcional dava cobertura ao risco de corrupção de funcionários da empresa contratante ou do Estado. Chegou a ser obrigatório para funcionários públicos e praticamente desapareceu.

Era um seguro curioso. O Segurado era o próprio funcionário e o garantido o Empregador, na maioria das vezes o Estado. Se o funcionário se apropriasse de dinheiro da repartição pública, a própria repartição apurava os fatos e o valor do alcance, encaminhava à Seguradora que, depois da habitual análise, pagava o sinistro. As taxas eram pequenas e o ramo bastante lucrativo.

Muitos leitores estarão pensando que atualmente este tipo de seguro levaria qualquer seguradora à falência. Pois os que assim pensam estão enganados. Para que o sinistro seja pago é preciso que fique provado que houve tal “alcance” por parte do funcionário. E nos dias de hoje parece impossível provar que ocorreu qualquer tipo de deslize em nosso País.

Pense em um funcionário de companhia de seguros examinando um dossiê de sinistros volumoso com mais ou menos 15.000 folhas. Ou melhor, como hoje estamos na era da informática, pensemos em um dossiê virtual. Nas primeiras páginas de tal dossiê aparece uma gravação, às vezes de voz e em outras de imagem, quase um longa-metragem, em que um dono de empreiteira, com cara de irmão-metralha, entrega um pacotão de dinheiro a uma respeitável senhora, dentro de uma sala luxuosa.

Tal senhora se encaminha ao elevador, desce, entra em um carro e se dirige a um ministério importante na Praça dos Três Poderes. No ministério já há um funcionário esperando que a conduz ao elevador privativo do Ministro.

O filme continua dentro do elevador mostrando a mesma mulher com uma maleta na mão e depois saindo desse elevador para entrar no gabinete do Ministro. Daí pra frente o que se vê é essa mulher saindo pela mesma porta, sem mala ou com a mala nitidamente vazia.

Aí eu pergunto ao leitor: você, como funcionário da seguradora Brasil Fidelidade pagaria ou não o sinistro? Pra você haveria prova contundente de que o segurado teria sido infiel? Se pagaria ou não pouco importa porque o filme vai continuar e apurar os culpados:

Primeiramente funcionários do gabinete do Ministro demonstrarão que dentro daquela porta há vários gabinetes com assessores e mais assessores do Ministro e que qualquer um deles pode ter recebido a mala recheada. Em segundo lugar se tentará culpar a Polícia Federal por que esta teria vazado informações de um processo sigiloso.

Daí a alguns dias outras malas terão aparecido na mídia e a Operação Navalha terá ficado ultrapassada e dali a anos, se Deus quiser, ter-se-ão apurado os únicos culpados de todo o processo: o ascensorista que não verificou se o elevador estava sendo filmado e a mala, por carregar dinheiro suspeito.

Convido o nobre leitor a abrir uma seguradora de Fidelidade Funcional. Pelos estudos atuariais que realizei essa será uma das mais rentáveis empresas de nosso País, com ações nas bolsas de Nova York e Pequim, com grande repercussão no mundo por ser a única empresa de seguros que jamais teve de pagar nem um único sinistro.

Não que ninguém tenha roubado… Mas nunca ninguém conseguiu provar! (Julio Bierrenbach – juliobier@uol.com.br)

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