No dia 15 de janeiro deste ano, o governo brasileiro sancionou a Lei Complementar 126, que abre o mercado de resseguros. O Brasil era um dos poucos países no mundo que ainda mantinham o monopólio do mercado ressegurador. O Instituto de Resseguros do Brasil, hoje IRB – Brasil Re, empresa criada em 1939, detinha o monopólio das operações no país.
Entretanto, nos últimos anos, o mercado segurador brasileiro já vinha experimentando uma flexibilização nas operações de cessão. As sociedades seguradoras, sob autorização do IRB, realizavam cotações no mercado internacional, podendo até realizar contratações com a consonância do ressegurador brasileiro.
Atualmente o IRB é considerado o maior ressegurador da América Latina. A sua composição acionária é formada pelo setor privado, integrada pelas sociedades seguradoras em operação no Brasil, e pelo Governo, na proporção de 50% para cada. Segundo dados de 2006, divulgados por aquela resseguradora, os ativos totais somam em torno de R$ 5 bilhões (U$ 2,33 bilhões), e o quadro de pessoal é composto por 524 funcionários.
A transição para o novo modelo aberto será realizada de forma gradual. Nos primeiros três anos após a entrada em vigor da Lei, a cedente contratará ou ofertará, preferencialmente às resseguradoras locais, pelo menos 60% de sua cessão. Após esse período, o percentual mínimo será de 40%.
As resseguradoras foram qualificadas em três tipos: 1. Ressegurador local – ressegurador sediado no País, constituído sob a forma de sociedade anônima; 2. Ressegurador admitido – empresa sediada no exterior, com escritório de representação no País; e 3. Ressegurador eventual – empresa resseguradora estrangeira sediada no exterior sem escritório de representação no País.
A Lei veda ainda a operação com empresas sediadas em paraísos fiscais, impedindo, dessa forma, possíveis operações de lavagem de dinheiro, evitando também, a transferência de riscos sem garantias adequadas.
As normas serão editadas nos próximos meses pelo Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) e a supervisão e regulação do mercado estarão sob a responsabilidade da Superintendência de Seguros Privados (Susep), órgão supervisor do mercado brasileiro de seguros, previdência aberta e capitalização.
Esse novo arcabouço normativo para o mercado ressegurador, sem dúvida, se constituirá em grande desafio, já que a regulação e a supervisão do mercado segurador puro e do mercado ressegurador diferem na forma de atuação, apesar de apresentarem semelhanças e princípios análogos, tais como: questões atuariais, solvência e regras contábeis.
As resseguradoras têm papel fundamental na estabilidade do mercado de seguros, pois, por característica, operam em bases globais, pulverizando riscos e reduzindo a exposição a eventuais prejuízos, aumentando, desse modo, a capacidade de subscrição das seguradoras. Assim sendo, os negócios realizados pelas resseguradoras levam em consideração a localização dos riscos, os tipos de negócio e as diferenças de regulamentação entre os diferentes países e regiões que operam.
Como a natureza das operações de resseguro é global e transfronteiriça, a segurança dos mercados depende muito da atuação direta dos supervisores do país no qual a resseguradora está constituída. O sistema de intercambio de informações entre órgãos supervisores é vital para a estabilidade dos mercados, não sendo suficiente depositar a confiança na avaliação efetuada por agências classificadoras de risco (agências de rating) como forma única para aferir o grau de segurança de uma resseguradora.
No que tange aos investimentos, as seguradoras primárias e resseguradoras investem em ativos que apresentam segurança, rentabilidade, diversificação e liquidez para atender as suas obrigações quando demandadas. As operações das resseguradoras, no entanto, são mais complexas, uma vez que combinam o gerenciamento de ativos e passivos em diversas moedas em inúmeras regiões e países, com legislações e costumes diferentes. Devem, ainda, estar preparadas para, a qualquer tempo, lidar com a possibilidade de indenizar grandes perdas oriundas de catástrofes que venham a afetar diretamente às seguradoras primárias.
As operações de resseguro apresentam características muito afiguradas ao mercado financeiro, sendo facilmente afetadas por desequilíbrios contábeis, patrimoniais e da economia como um todo, comprometendo rapidamente mercados e empresas consideradas estáveis em um dado momento.
No entanto, embora hoje existam ferramentas e controles capazes de analisar riscos e prevenir situações de desequilíbrio, a eficiência e a eficácia destes métodos dependem do conhecimento e da interação entre os mercados e os supervisores. Por sua vez, a estabilidade e a credibilidade dos mercados resultam do monitoramento e da competência dos supervisores, o que torna o intercambio de informações sobre métodos e experiências necessário e imprescindível à adequada execução das obrigações de supervisão e regulação.
Outra característica do resseguro reside no fato de que os contratos entre as partes (cedente e ressegurador) são desenhados de acordo com as especificidades e necessidades da abrangência de cada negócio. A negociação e o clausulado dos contratos não podem ser engessados ou sofrer imposições que privem ou desestimulem a capacidade de inovação das partes envolvidas. O desafio para o órgão regulador reside, portanto, em encontrar o equilíbrio e o ajuste adequado das normas e regras que irão balizar o mercado, mas que, ao mesmo tempo, não interferiram na sua capacidade de inovação e flexibilidade. Para o supervisor torna-se imprescindível o conhecimento das relações entre as partes e o acesso a todas as informações dos negócios.
Os resseguradores estrangeiros são exigentes em relação aos seus negócios. Demandam padrões de controle e solidez dos seus parceiros de forma a permitir uma relação de confiabilidade e fidelidade. Tais exigências deverão harmonizar e acomodar o mercado brasileiro de seguros, tornando ainda mais competitivas as empresas que já apresentam o grau de conformidade requerido pelas resseguradoras estrangeiras. As seguradoras com menor grau de organização e controle deverão buscar, então, a readaptação às novas exigências ou a sua recolocação no mercado.
Para o mercado ressegurador não existem negócios vantajosos com ganhos fáceis e rápidos. Negócios altamente voláteis e arriscados não são interessantes para empresas sólidas e confiáveis. As resseguradoras buscam segurança, previsibilidade e longevidade nos seus negócios.