Em dados trazidos pelo Valor Investe, o fortalecimento das bets acabou fazendo os brasileiros gastarem o dobro do que destinaram a pagamentos de seguros do tipo Vida e Automóveis em 2024. Até mesmo o setor de seguros admite precisar melhorar sua comunicação junto à população para ampliar as ações focadas em educação financeira: “Quando vemos o volume da renda do cidadão gasto com apostas, cabe a nós o questionamento: por que essas pessoas não estão direcionando esses valores para os bons instrumentos disponíveis e que, de fato, vão protegê-lo? O setor tem um desafio de entender esse cenário”, exemplifica Júlia Normande Lins, diretora da Superintendência de Seguros Privados (Susep), durante a 12ª Semana Nacional de Educação Financeira (Semana Enef).
Segundo dados da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), esses gastos com apostas online foram de R$240 bilhões em 2024. Nesse mesmo período, um estudo feito pela Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (Fenaprevi), baseado nas informações da Superintendência de Seguros Privados (Susep), mostrou que o setor de seguros arrecadou R$ 72,7 bilhões em prêmios (quantia que as pessoas pagam regularmente às seguradoras para manter suas apólices e certificados ativos).
Dados compartilhados pelo Banco Central, a população acima dos 60 anos no Brasil gastou mais de R$3 mil mensais em apostas no ano de 2024. Segundo Ângela Beatriz de Assis, vice-presidente da Fenaprevi, essa disposição no tamanho do gasto a curto prazo é muito mais forte, além dessa cultura comprometer o presente e o planejamento de longo prazo: “Sabemos que 65% dos brasileiros pensam em se planejar para o futuro, mas dizem que não conseguem guardar dinheiro. O que muitos não percebem é que o valor de apenas um mês de apostas, dividido ao longo do ano, ou seja, R$250, se aplicados durante 30 anos, vão gerar uma boa complementação de renda”, explica. “Precisamos falar mais sobre a importância dele pensar no futuro com esse brasileiro que está envelhecendo e vivendo mais”, complementa.
No fim de 2024, foi sancionada a regulação do setor de apostas esportivas, e começou a vigorar em janeiro deste ano. De acordo com o BC, estima-se que foram movimentados R$20 bilhões e R$30 bilhões por mês em apostas online nos três primeiros meses de 2025.
Foco em baixa renda e trabalhadores autônomos nos seguros
Temas como planejamento financeiro e investimentos em previdência são os mais discutidos pelas 73 empresas supervisionadas pela Susep para a promoção da educação financeira. Sites e plataformas devem ser criadas, estima-se cerca de 21%, seguida por materiais educativos (16%) e campanhas educacionais. A indústria têm tido foco nos adultos de 20 a 59 anos.
Segundo Lins, os dados demonstram que há um esforço do setor para tomar informações mais disponíveis, além do acesso aos produtos precisar avançar na mesma medida, especialmente dentro dos núcleos populacionais de mais baixa renda e maiores níveis de informalidade: “Se trabalharmos para educar as pessoas de baixa renda, mas elas não conseguem contratar os produtos que temos hoje, há uma frustração. Também é preciso reconhecer que essas pessoas nem sempre têm a melhor experiência com os produtos contratados, pois a expectativa de indenização é diferente. São inúmeras situações singulares que desafiam o regulador”, comentou.
De acordo com a Fenaprevi, a nova realidade geracional de emprego e renda devem ter ofertas de produtos cada vez mais alinhados ao passo que a indústria de seguros terá.
Um exemplo claro de produtos que precisam ser desenvolvidos nas novas configurações de trabalho devem ser os voltados para motoboys, como destaca a Federação Nacional de Seguros Gerais (FenSeg): “A moto usada para o trabalho, muitas vezes, é comprada de forma parcelada. A perda desse bem afeta o sustento da família e gera inadimplência. Para quem tem menos renda, menos poupança e menos resiliência financeira, o seguro se mostra ainda mais necessário. No final, não é sobre quanto se paga, mas o que se garante a partir do seguro”, sustenta Ney Ferraz Dias, presidente da FenSeg.
A FenSeg estima que 1,6 e 1,7 milhão de motos são seguradas, sendo considerado um número pequeno diante da frota em circulação (34,4 milhões em 2024).
Emerson Del Re, vice-presidente da Comissão de Seguros Gerais Afinidades da FenSeg, destaca o apelo dos seguros residenciais junto aos donos de pequenos negócios. “Para o empreendedor de baixa renda, o seguro residencial é um investimento no próprio negócio. É um seguro com preços atrativos, com inúmeros serviços agregados, como encanador e eletricista, e que permite continuar produzindo”.
Segundo a Susep, final do ano contará com a publicação de um relatório com os aprendizados obtidos no desenvolvimento de diferentes linguagens e modelos de seguros testados no Sandbox, o ambiente regulatório experimental que incentiva a implantação de projetos inovadores. Esses testes estão sob a supervisão da Susep, e são focados em novos produtos e novas formas de prestar serviços tradicionais. Já foram avaliados 11 projetos em seu primeiro edital do Sandbox e 21 no segundo. A terceira edição foi anunciada para 2025.