José Montes Limarino foi preso por homicídio. A prisão colocou fim a uma farsa que durou 13 anos: ele trabalhava no setor de cobranças de uma empresa e vivia tranquilamente com a família em Campinas. Em 1995, quando tinha 34 anos, ele morava em Taboão da Serra, na Grande São Paulo. No dia 25 de fevereiro daquele ano, a polícia encontrou o carro dele queimado. Dentro, havia um corpo e a identidade de José Limarino.
“Tudo levava a crer que se tratava do próprio dono do automóvel”, disse o promotor de Justiça Romeu Galiano Júnior.
Mas um detalhe chamou a atenção do Ministério Público. “O encontro de um RG, com a foto bem legível, em um carro totalmente queimado levava a policia a crer que alguém tinha interesse na identificação daquele corpo”, afirmou o promotor de Justiça Romeu Galiano Júnior.
No dia do crime, Maria do Carmo Evangelista procurou a polícia para registrar o desaparecimento de outra pessoa: o marido Ismael Evangelista, um mecânico praticamente da mesma idade, altura e peso de José Limarino. Dona Maria não se esquece da última vez que viu o marido.
“Ele falou: ‘Neguinha’ – ele me chamava de Neguinha – ‘Neguinha, eu vou trabalhar. À noite eu trago dinheiro para nós comprarmos as coisas’”, conta Maria do Carmo Evangelista, mulher de Ismael.
Investigações
Como Ismael não voltou pra casa, a polícia ficou com um quebra-cabeça nas mãos: duas pessoas desaparecidas e um único corpo no local do crime. Mas uma descoberta foi fundamental para a investigação: José Limarino tinha dois seguros: um de vida e outro do carro. Um mês antes, todas as parcelas foram quitadas. Na época, o valor do seguro chegava a R$ 20 mil. Hoje daria 65 mil.
Tudo indicava que José Limarino tinha assassinado uma pessoa com as mesmas características físicas para simular a própria morte, mas eram só indícios. Certeza mesmo o Ministério Publico não tinha.
“Os órgãos oficiais de perícia nos informavam que não havia tecnologia pro exame de DNA que se necessitava nesse caso, em razão da idade da ossada e das condições de conservação”, conta o promotor de Justiça Romeu Galiano Júnior.
Durante 13 anos, a família do mecânico Ismael teve que conviver com a dúvida.
“A gente pensa: Será? Se viajou e não volta. Mas na mesma hora eu pensava: ele não ia fazer isso”, disse Maria do Carmo Evangelista, mulher de Ismael.
“Meu sonho era de ver ele chegando, enfim, ‘Cheguei, o pai chegou’, sabe, de receber aquele abraço, aquele carinho”, conta Mariana Evangelista, filha de Ismael.
Sem conseguir identificar a vítima, o Ministério Público resolveu preservar os ossos e esperar pelo avanço da tecnologia. Só recentemente, um laboratório de genética, em Paulínia, interior de São Paulo, deu a resposta definitiva: o corpo é mesmo do mecânico Ismael. Limarino foi preso por homicídio.
“Conclui-se sem a menor sombra de dúvidas que o cadáver encontrado queimado dentro daquele veículo era de uma pessoa inocente”, afirmou o promotor de Justiça Romeu Galiano Júnior.
“É gratificante você fazer o trabalho dentro do laboratório, onde é tudo impessoal, e depois no fim você vê o resultado disso, positivo, na vida aplicada para a população”, comentou o geneticista Welber Oliveira Bragança.
Crime
Depois do assassinato, José Limarino se escondeu em Mato Grosso. Nos últimos anos, viveu no interior de São Paulo, sempre mudando de endereço e mantendo contato com a mulher e a filha.
Para o delegado de Campinas, ele confessou que planejou o crime porque passava por problemas financeiros. Mas o dinheiro do seguro nunca foi pago. O banco esperava o fim da investigação.
“Pensei em matar. E fui junto para matar. Já tinha gasolina dentro do carro também. Tudo premeditado. Pretendia fazer alguma coisa com o seguro”, reconhece José Limarino.
Ele alega que teve a ajuda de um comparsa. Mas, para o Ministério Público, o acusado agiu sozinho. José Limarino acreditava que o caso já tinha caído no esquecimento. Tanto que usava o nome verdadeiro. Chegou a renovar a carteira de motorista e até tirou uma nova carteira de identidade. Agora que tudo foi esclarecido, ele pode pegar até 30 anos de prisão.
“Aquele velho ditado: aqui se faz aqui se paga”, comenta José Limarino.
E finalmente, depois de 13 anos de espera, a família de Dona Maria vai receber autorização para fazer o velório e o sepultamento do mecânico Ismael Evangelista.
“Agora vou fazer o enterro direitinho, colocar lá ele pra ele descansar em paz, porque por todo esse tempo ele não descansou, nem nós também”, diz Maria do Carmo Evangelista, mulher de Ismael.