Notícias | 10 de março de 2004 | Fonte: Valor Econômico

Experiências internacionais em parcerias público-privadas

A Parceria Público-Privada (PPP) não é uma uma criação brasileira. A experiência internacional, que já conta com um histórico de mais de uma década, é muito rica em exemplos bem sucedidos que podem trazer importantes lições para o Brasil na sua trajetória rumo a novos investimentos.

A PPP, no sentido mais inovador da expressão, foi concebida na Inglaterra no início da década de 90, já tendo sido adotada com sucesso em diversos países, como Portugal, Holanda, Irlanda, África do Sul e Canadá. A PPP também não é exclusividade de países desenvolvidos, constituindo uma realidade importante nos países da Europa Central e na própria América Latina, onde se destacam o México e o Chile.

No caso dos países da Europa Central, as PPPs estão sendo incentivadas pela própria Comissão Européia (CE) como meio para que aqueles possam alcançar o equilíbrio orçamentário exigido para sua adesão à União Européia, sem prejuízo da realização de investimentos prioritários. A CE divulgou diretrizes para a implementação bem-sucedida de PPPs, muitas das quais são aplicáveis ao Brasil.

Outras iniciativas dignas de nota podem ser citadas no âmbito das Nações Unidas, de agências multilaterais como o Banco Mundial e o BID e da OECD, todas em favor das PPPs.

A experiência inglesa é a mais emblemática, pois é fruto de projetos desenvolvidos e testados há mais tempo. Em 2003, as estatísticas oficiais registravam 560 projetos em PPP implementados naquele país, envolvendo investimentos da ordem de 35 bilhões de libras.

A experiência inglesa revelou-se tão bem-sucedida que, reduzindo-se consideravelmente a percepção de risco, atualmente discute-se como repartir entre a iniciativa privada e o poder público os ganhos decorrentes de refinanciamento que permitiu a redução das taxas de juros durante a execução dos primeiros projetos PPPs. Atento a esse precedente, o nosso projeto de lei federal previu o compartilhamento desses ganhos como cláusula obrigatória do contrato de PPP. Outras tantas lições podem ser extraídas da experiência internacional.

A PPP não é uma panacéia. O uso da PPP deve ser estudado cuidadosamente caso a caso, justificando-se tão somente quando as formas tradicionais de contratação da iniciativa privada forem inviáveis. Se o ente privado puder recuperar seu investimento por meio de tarifa cobrada aos usuários, então o regime recomendável será o de concessão tradicional. A concessão só não será recomendável neste caso se o interesse público exigir que o poder concedente mantenha a prerrogativa de fixar a tarifa abaixo do custo do serviço ou reajustá-la aquém dos índices de inflação.

A adoção da PPP deve trazer vantagens e maior eficiência em relação a outras formas de contratação da iniciativa privada, com resultados mensuráveis pela sociedade. É o “value for money”.

Em 2001, o governo inglês já havia assumido compromissos da ordem de 100 bilhões de libras em contratos de PPP com vencimentos até 2026. Não se trata de endividamento, ou seja, compromisso financeiro decorrente de utilidades já consumidas ou recursos já despendidos, mas obrigações contratuais que se tornarão devidas na medida em que os serviços contratados junto à iniciativa privada sejam entregues obedecendo a parâmetros de qualidade acordados. Essa característica da PPP privilegia a eficiência, pois só haverá desembolso do estado mediante contrapartidas previamente definidas.

Outra lição é que um ambiente favorável a novos investimentos em PPP requer não só um marco regulatório, mas uma experiência e cultura em PPPs que só poderão ser alcançadas com a implementação dos primeiros projetos.

Essencial, portanto, que os projetos-piloto sejam bem escolhidos dentre aqueles que tenham maior apelo social e melhor realcem as vantagens das PPPs, para que outros projetos possam segui-los numa verdadeira progressão geométrica. Não se deve cometer o erro de se lançar precipitadamente muitos projetos antes que esses precedentes possam ser cuidadosamente construídos.

Foi exatamente essa a postura inglesa. De 1990 a 1993, as estatísticas apontam a conclusão de 10 projetos de PPPs pelo governo nacional, registrando um crescimento exponencial a partir de então, com 106 projetos apenas no ano de 2000. Todos esses precedentes permitiram o desenvolvimento de uma valiosa experiência, incluindo modelos minuciosos de contratos que, graças à padronização das melhores técnicas, atualmente são empregados para implementar PPPs de uma forma muito mais célere, menos custosa e mais transparente para os órgãos de controle e a sociedade.

É um erro imaginar que a experiência internacional não possa trazer lições úteis ao Brasil. Apesar das inegáveis diferenças sócio-econômicas entre os países, muitos dos problemas que hoje enfrentamos já foram superados por outros. Cabe ao governo brasileiro e aos seus parceiros privados aproveitar essas lições e, com criatividade e esforço, adaptá-las ao nosso contexto.

Este é o segundo de uma série de 15 artigos sobre as parcerias público-privadas (PPPs)

Antonio Corrêa Meyer e José Virgílio Lopes Enei são sócios do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados

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